DOC DO ARTETETURA MOSTRA A VIDA, OBRA E MORTE DA BANDA SEPULTURA: 40 décadas de uma das maiores banda de metal do mundo e de Minas Gerais

Foto: Acervo/Divulgacão


Freud explica que a psique humana é ambivalente, em um cabo de guerra entre a pulsão de vida e morte. Elias acrescentaria que o sujeito vive em meio a uma balança nós-eu, multissituado entre pertencimentos sociais e instintos egoicos. Igualmente criativas, a harmonia e o caos se combinam, em graus variados, na mente e na sociedade, para formar ideologias e movimentos sociais e culturais ao longo da história da humanidade. Um mesmo território pode servir de background para o surgimento de forças expressivas diversas e até mesmos opostas, gerando conflitos prático-discursivos por "lugares de memórias", a partir de contrastes aparentes e estigmatizações negativas, como o caráter esquerdista ou comunista associado à MPB e anarquista ou totalitarista, à cena punk/metaleira ou mesmo rockeiro nacional. 

O Clube da Esquina surgiu em BH, cidade ortogonal planejada, em meio a um terreno acidentado repleto de montanhas inesperadas, que torna a altitude uma informação útil a constar no GPS. Repleta de infinitas esquinas, como a da Rua Paraisópolis com Divinópolis, onde nos anos 60, no católico Bairro de Santa Tereza, surgiu um ideal de pólis mais participativo. Nesse microterritório, liderado pelo carioca mineral Milton Nascimento, um dos maiores movimentos musicais da MPB e do rock brasileiro (Lô Borges, Beto Guedes e 14 Bis), surgiu de Minas para o mundo, mostrando uma nova forma de ressignificar o espaço urbano e político. 

Provando que um raio pode cair 2 vezes no mesmo local, em 1983 surgiu em Santa Tereza a banda metaleira mais famosa do Brasil, Sepultura, que à exemplo de Minas, passou a exportar o black metal brasileiro, sendo reconhecida internacionalmente. Formada pelos mineiros Paulo Xisto e Jade Guedes e os irmãos paulistanos Max e Igor Cavalera, que eram vizinhos da casa da Família Borges -, ancoradouro afetivo dos integrantes do Clube da Esquina -, logo, se tornaria um local de peregrinação de camisetas-pretas, o que contribuiu para transformar BH na capital do black, death e thrash-metal no Brasil, apesar da banda Overdose, que dividiu seu primeiro disco com Sepultura, ter sido de metal melódico. Por meio também de points aglutinativos como o Tunel do Rock, a Cogumelo Records, a Tribo de Solos e a Casa Matriz, surgiram nos anos 80 muitas bandas cabeludas na cidade, como Chakal, Multilator, Holocausto, Witchhammer e a Sarcófago, banda rival e irmã do Sepultura, cujo líder, Wagner Moura Lamounier, fora o primeiro vocalista dessa, antes de Max assumir os vocais. Como as músicas são cantadas, quase sempre, em inglês e em uma levada muito agressiva e anticordialista, esses gêneros não lograram se tornar muito populares no Brasil, sendo ignorados pela maioria das rádios e Tvs, que consagrou a MPB e seus subprodutos como ícones imortais da identidade nacional, como se fossem donatários de capitanias hereditárias musicais. 

Após a controversa saída de Max, por motivos familiares e contratuais, e, 10 anos depois, da de Igor Cavalera, por incompatibilidade artística, Sepultura não esmoreceu com a entrada do gigante gentil, o vegano afroamericano Derick Green nos vocais e do mineiro Eloy Casagrande na bateria, que apesar de ter sido uma grande revelação da cena, não resistiu às penosas longas turnês internacionais longe de Minas.

Independentemente dos conflitos da Política do Café com Leite (SP X MG) no Sepultura, ao guitarrista paulistano Andreas Kisser -, último membro a integrar a banda após se mudar para capital mineira nos anos 80 com este fim -, coube o papel de tentativa cordialista de nacionalização da banda, visando manter vivo o ideário mortífero do Sepultura na cultura pop brasileira, refratária à músicas com temas e sonoridades pesadas. 

Assim, como ocorreu, anos depois com André Matos do Angra, Max, que seguiu como contratado da gravadora RoadRunner, criou uma nova banda, a Soulfly, tendo agora como paisagem cultural de inspiração o tema da espiritualidade totêmica e ritualística, suscitada pelas áridas montanhas do Orizona, onde passou a viver em companhia de sua esposa e empresária, e seus filhos músicos, que integram seus múltiplos projetos artísticos. Após a saída de Igor do Sepultura, os irmãos já reconciliados, voltaram a tocar juntos no projeto sazonal "Cavalera Conspirancy", em nome dos novos e velhos tempos, lançando músicas inéditas e fazendo também releituras dos clássicos do Sepultura. Em 2023, Andreas, após a dolorosa morte de sua esposa Patrícia em 2022, anuncia que a banda mais famosa do Brasil fora do Brasil fará sua última e demorada turnê, após um período sabático, em que se dedicou ao resgate de sua fase musical de formação, como violonista clássico, se apresentando com um quarteto de cordas no Teatro Municipal de São Paulo, juntamente, com seu filho Yohan. 


Este novo doc da série "Terra-Pia Musi-Caos" de Fred Le Blue tenta, a partir de fragmentos do arquivo público virtual sobre o (re)nascimentos e "sepultamentos" da banda Sepultura e suas raízes e rejeitos sagrentos, que denotam uma brasilidade também rítmica e folclórica afroindígena pós-colonial, como celebrado no disco "Roots" (1996), por meio da participação do baiano Carlinhos Brown (Timbalada). O intuito desse almanaque audiovisual que faz uma arqueologia das pérolas e dos dejeitos do metal mineiro-paulistano é suscitar um debate filosófico e teológico sobre a complementaridade dos arquétipos do sagrado (católico) e profano (satânico) no inconsciente coletivo, a partir da superação, por exemplo, de falsas antinomias entre a voz angelical-pueril plástico-escultural de Milton do Nascimento e a gutural-apocalíptica arte-reciclável de Max do Sepultura, no que aponta para o processo de individuação (introversão-extroversão) em busca de equilibrar o self, proposto por Jung. Ambos os expoentes da MPB e do Metal Impopular Brasileiro de Santa Teresa -, respectivamente, assim como também é o Skank, da Música Pop Brasileira, que seria uma espécie de terceira margem desse rio musical belo-horizontino polarizado -, refletem a capacidade polivalente e antropofágica da cultura brasileira e mineira em assimilar elementos estéticos e sociais "vanguardísticos" e ressignificá-los de formas autênticas e acessíveis, inspirado por seu "som-local".


“NASCIMENTO IN SEPULTURA (parte 1 * Nascimento)" - BRA, 2023, 55`

Dia 06 de janeiro (sábado) 

Link: https://youtu.be/YnNaMqhpdvs

Trailer-Clip Parte 1: https://youtu.be/N8pyXpNpw5k


“NASCIMENTO IN SEPULTURA (parte 2 + Sepultamento)" - BRA, 2023, 55`

Dia 13 de janeiro (sábado)

Trailer-Clip Parte 2: https://youtu.be/5USeRIWshDc

Link: https://youtu.be/XPpboB7QPqk

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